Viñas Chilenas, Concepción e Terremoto - Chile -2010
- Roberto Caldas
- 31 de out. de 2021
- 16 min de leitura

Jardim instalado no século XIX, casarão de veraneio da Família Concha y Toro (1875), fundador Melchor Concha y Toro, Pirque, Provincia de Cordillera, Região Metropolitana de Santiago, Chile.
Após nosso retorno da região litorânea de Valparaíso e Viña del Mar a Santiago, fomos visitar vinícolas na Região Metropolitana.
Contratamos um passeio às Viñas Undurraga e Concha y Toro.
1 - Viña Undurraga
Undurraga foi fundada, em 1885, por Francisco Undurraga Vicuña, agricultor e empresário chileno, de origem basca; para isso, planejou e passou à ação a partir de 1879, importando as castas Pinot Noir e Cabernet Sauvignon, da França, e Riesling e Gewürztraminer, da Alemanha, contratando o viticultor M. Pressac e um toneleiro, na França, e adquirindo, para a confecção dos tonéis, a madeira das caixas em que eram transportadas as armas compradas pelo Chile para a Guerra do Pacífico.
A sede da viña foi construída em Talagante, Valle del Maipo, na Região Metropolitana de Santiago.
A viña foi a primeira chilena a exportar vinho aos Estados Unidos da América, em 1903, com uma caixa de Pinot em cada um dos quarenta e cincos estados existentes na época.
O primeiro astronauta a pisar na Lua, Neil Armstrong, visitou a viña em 1970.

Viña Undurraga, recepção, Camino a Melipilla, km 34, Talagante, Valle del Maipo, Região Metropolitana de Santiago, Chile.

Viña Undurraga, recepção, Camino a Melipilla, km 34, Talagante, Valle del Maipo, Região Metropolitana de Santiago, Chile.

Entrada da Viña Undurraga, Casa Patronal, fundada em 1885 por Don Francisco Undurraga Vicuña, Talagante, Valle del Maipo, Região Metropolitana de Santiago, Chile.
A visita inicia pelo Parque de la Viña. Por volta de 1890, foi iniciada a construção desse parque, ao encargo do paisagista francês George Henri Dubois, com a plantação de árvores como cedro do líbano, eritrina do trópico, tamareira, bordo japonês e outras espécies.

Parque de la Viña, criado pelo paisagista francês George Henri Dubois, Viña Undurraga, Camino a Melipilla, km 34, Talagante, Valle del Maipo, Região Metropolitana de Santiago, Chile.
Em seguida, continuamos em direção ao Rincón Aliwen, onde estão plantados alguns espécimes da vegetação autóctone do Sul do Chile, em homenagem ao povo nativo da região, Mapuche, bem como há figuras da cultura que representam sua cosmovisão.

Rincón Aliwen, onde são vistos alguns totens da cultura Mapuche, Viña Undurraga, Camino a Melipilla, km 34, Talagante, Valle del Maipo, Região Metropolitana de Santiago, Chile.

Totem do povo Mapuche, Rincón Aliwen, Viña Undurraga, Camino a Melipilla, km 34, Talagante, Valle del Maipo, Região Metropolitana de Santiago, Chile.
Depois fomos no propriamente dito Fundo (fazenda) Santa Ana (batizado assim em homenagem à esposa do fundador, Ana Fernández de Iñiguez) onde há plantações de videiras para produção de vinhos, particularmente com as castas tintas Cabernet Sauvignon, Carménère, Merlot, Pinot Noir, Syrah e a branca Chardonnay, dentro outras.
Então se percorre parte do vinhedo, conhecendo as diversas castas cultivadas na Undurraga e o processo de vinificação dos diferentes vinhos.

Visita a um dos vinhedos de Pinot Noir, Fundo Santa Ana, Viña Undurraga, Camino a Melipilla, km 34, Talagante, Valle del Maipo, Região Metropolitana de Santiago, Chile.

Visita a um dos vinhedos de Pinot Noir, Fundo Santa Ana, Viña Undurraga, Camino a Melipilla, km 34, Talagante, Valle del Maipo, Região Metropolitana de Santiago, Chile.

Cachos de uvas nas videiras, frutas bem doces para se transformarem em álcool, na produção do vinho. Fundo Santa Ana, Viña Undurraga, Camino a Melipilla, km 34, Talagante, Valle del Maipo, Região Metropolitana de Santiago, Chile.
Na sequência, fomos conhecer as bodegas subterrâneas do Fundo Santa Ana, locais onde ocorrem o armazenamento e o envelhecimento dos vinhos em tonéis.

Centenária bodega subterrânea da Viña Undurraga, Camino a Melipilla, km 34, Talagante, Valle del Maipo, Região Metropolitana de Santiago, Chile.

Bodegas subterrâneas da Viña Undurraga, Camino a Melipilla, km 34, Talagante, Valle del Maipo, Região Metropolitana de Santiago, Chile.
A visita termina com uma degustação de vinhos da casa, e, ao final, recebemos cada um uma taça de presente.

Degustação de vinhos da Viña Undurraga, Camino a Melipilla, km 34, Talagante, Valle del Maipo, Região Metropolitana de Santiago, Chile.
Ainda na década de 1870, o fundador importou da Alemanha a então famosa garrafa Bocksbeutel ou Caramayola, cujo exemplar "gigante" encontra-se no alto do portão de entrada da viña.
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No alto do portão de entrada, botella Bocksbeutel (Caramayola), importada da Alemanha (Francônia), vista a partir do pátio da Viña Undurraga, Camino a Melipilla, km 34, Talagante, Valle del Maipo, Região Metropolitana de Santiago, Chile.
Após a visita à Viña Undurraga, quando nos dirigíamos a Concha y Toro, fizemos uma parada no Restaurante La Vaquita Echá (vaquinha deitada), de comida tradicional chilena, principalmente à base de carnes e linguiças.

Restaurante La Vaquita Echá (1979), avenida Ramón Subercaseaux, 3355, Pirque, Provincia de Cordillera, Região Metropolitana de Santiago, Chile.
2 - Viña Concha y Toro
A Viña Concha y Toro foi fundada em 1883, na zona de Pirque, no Valle del Maipo, por Melchor de Concha y Toro, VII Marquês de Casa Concha, advogado, político e empresário chileno. Para isso, ele importou castas francesas da região de Bordeaux, adquiriu equipamentos de vinificação e construiu bodegas subterrâneas para armazenar seus vinhos.
Hoje, é a maior produtora e exportadora de vinhos da América Latina, e, segundo a própria empresa, é a marca de vinhos mais admirada do mundo, tendo como carros-chefes, no âmbito internacional, os vinhos Don Melchor e Casillero del Diablo.
A empresa produz, a partir de suas plantações espalhadas pelos vales chilenos, vinhos das cepas Sauvignon Blanc, Chardonnay, Pinot Noir, Viognier, Merlot, Pinot Gris, Pinot Blanc, Syrah, Carmenere, Riesling, Malbec e Cabernet Sauvignon.

Entrada da Viña Concha y Toro, Av Virginia Subercaseaux, 210, Pirque, Provincia de Cordillera, Região Metropolitana de Santiago, Chile.
Em Pirque, a família Concha y Toro levantou uma Casa de Veraneio em 1875, que foi englobada pela sede da vinícola.
A visita inicia nesse palacete de verão de estilo italiano, com elementos coloniais chilenos.

Jardim instalado no século XIX, casarão de veraneio da Família Concha y Toro (1875), fundador Melchor Concha y Toro, Pirque, Provincia de Cordillera, Região Metropolitana de Santiago, Chile.
Em seguida, fomos conhecer os jardins em volta do palacete, desenhados por encomenda de Emiliana Subercaseaux, mulher de Don Melchor de Concha y Toro, nos quais podemos observar um belo lago e um parque com espécies vegetais de diversas partes do mundo, algumas centenárias.

Jardins da Viña Concha y Toro, Av Virginia Subercaseaux, 210, Pirque, Provincia de Cordillera, Região Metropolitana de Santiago, Chile.
No Valle del Maipo, local que visitamos, a produção de vinhos da Concha y Toro é feita a partir da vinificação da casta Carbernet Sauvignon.
Porém, na visita, há um lugar chamado Jardín de Variedades, no qual a viña apresenta pelos menos 25 cepas de uvas vinícolas que se encontram espalhadas pelo país.

Conhecido como Jardín de Variedades, é um mostruário das cepas plantadas pela vinícola Concha y Toro, Av Virginia Subercaseaux, 210, Pirque, Provincia de Cordillera, Região Metropolitana de Santiago, Chile.
Em seguida, visitamos as bodegas da viña, onde os diversos vinhos são armazenados para envelhecimento em barris de madeira.

Barris nas bodegas da Viña Concha y Toro, Av Virginia Subercaseaux, 210, Pirque, Provincia de Cordillera, Região Metropolitana de Santiago, Chile.
Uma das atrações é a bodega onde as garrafas dos vinhos da marca Casillero del Diablo são armazenadas.
Diz a lenda que, há mais de cem anos, Don Melchor de Concha y Toro, para impedir que seus vinhos fossem furtados, teria espalhado o boato de que em sua bodega morava o próprio Diabo. Rapidamente a estória se espalhou, e as pessoas que lá andavam ficaram aterrorizadas, e nunca mais desapareceu uma garrafa.
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Bodega do Casillero del Diablo, Viña Concha y Toro, Av Virginia Subercaseaux, 210, Pirque, Provincia de Cordillera, Região Metropolitana de Santiago, Chile.

Bodega do Casillero del Diablo, com a inscrição em espanhol "não há diabo bobo". Viña Concha y Toro, Av Virginia Subercaseaux, 210, Pirque, Provincia de Cordillera, Região Metropolitana de Santiago, Chile.
No final, degustamos alguns vinhos e ganhamos, cada um, uma taça de vinho com a marca da viña.
No dia seguinte, partimos de ônibus para Mendoza, Argentina, atravessando a Cordilheira dos Andes, no sentido contrário do que tomou o General San Martín e seu Ejército de los Andes, quando o fez para libertar o Chile. Mas isso é história para ser contada nos nossos posts "Mendoza, partes I e II, Oeste da Argentina".
Quando voltamos da Argentina, alugamos um coche e partimos para o sul do Chile; nosso objetivo era pousar em Concepción, a seguir, em Valdivia e chegar em Puerto Montt. Mas o terremoto nos pegou no meio do caminho.
3 - Vinã Santa Helena, San Fernando.
As estradas chilenas, na época, eram maravilhosas. Também nos sentíamos seguros, haja vista que o patrulhamento das rodovias era feito por tropa dos Carabineros de Chile.
A nossa primeira parada foi na vinícola Santa Helena, em San Fernando, antiga Provincia de Colchagua. Fundada em 1942, é muito conhecida pelos brasileiros pelos vinhos de mesmo nome. Hoje pertence ao grupo vinícola San Pedro (VSTP).
A nossa parada foi rápida, apenas para visitar a loja da vinícola.

Loja da Viña Santa Helena, Angostura, Valle de Colchagua, San Fernando, Chile.
4 - Viña San Pedro, Comuna Molina.
Continuamos nossa viagem pelas excelentes estrada chilenas até a Viña San Pedro, localizada na Comuna Molina, Provincia de Curicó, Región del Maule. Aqui a vinícola foi fundada em 1865 pelos irmãos Correa, pioneiros em trazer castas europeias para o Valle de Curicó.
Hoje, a viña faz parte do grupo VSPT, produtora dos conhecidos vinhos das marcas Gato Negro e León Tarapacá.
Também, pela pouco tempo disponível, visitamos somente a loja da vinícola.

Loja da Viña San Pedro, Longitudinal Sur (Ruta 5), quilômetro 205, Comuna Molina, Provincia de Curicó, Región del Maule, Valle Central, Chile.

Entrada da Viña de San Pedro, Longitudinal Sur (Ruta 5), kilometro 205, Comuna Molina, Provincia de Curicó, Región del Maule, Valle Central, Chile.
5 - Chillán
Na sequência, fomos a Chillán, na então Región del Biobío, hoje Región de Ñuble. Comunidade urbana muito antiga, fundada em 1580 por Martín Ruiz de Gamboa, então Governador e Capitão Geral do Chile, foi destruída completamente pelo abalo sísmico de 1751 e por novo terremoto em 1835.
Outro terremoto que deixou muitas marcas profundas na cidade e no país foi o de 1939, com mais de 30.000 mortos, maior número de vítimas fatais em toda a história do Chile, e que determinou, em razão dos danos nas construções, a troca total da arquitetura da cidade.

Estátua de Bernardo O'Higgins, inaugurada em 1918, em homenagem ao centenário do Chile (1910), Plaza de Armas de Chillán, capital da Región de Ñuble, Chile.
A Catedral de Chillán foi bem danificada pelo terremoto de 1939, tendo sido reiniciada sua construção em 1941 e concluída em 1960, de arquitetura moderna, baseada nos hangares do Aeroporto de Orly, na França
Ao lado da catedral, ergueu-se a Cruz Monumental, em memória das vítimas do terremoto de 1939, e serve como campanário do templo católico.

Catedral de Chillán, construída entre 1941 e 1960, arquiteto Hernán Larraín Errázuriz; ao lado, a Cruz Monumental, homenagem aos mortos do terremoto 1939, Chillán, capital da Región de Ñuble, Chile.
Em seguida, nos dirigimos à cidade de Concepción, a terceiro maior cidade do Chile.
6 - Concepción e o Terremoto
Chegamos em Concepción no final da tarde.
Concepción foi fundada, em 1550, por Pedro de Valdivia, em nome da Coroa Espanhola, com o nome de Concepción de María Purísima del Nuevo Extremo.
Sua localização inicial foi na Bahía de Concepción, tendo sido alvo de piratas e corsários holandeses e ingleses, como Francis Drake, e de ataques dos nativos mapuches, liderados por Caupolicán (ver Cerro Santa Lucía, no nosso post Santiago I - Chile 2010) e Lautaro. Mas, em razão da grande destruição causada pelo abalo sísmico de 1751 e seu respectivo maremoto, o centro urbano foi deslocado para o Valle de la Mocha, onde se encontra até hoje.
A atual Catedral de la Santísima Concepción foi erguida em substituição à antiga catedral existente no mesmo lugar, que havia sido inaugurada em 1867, com base no projeto de Jean Herbage, em estilo neoclássico, e que tinha como destaque suas altas torres, que haviam sido incorporadas ao templo, em 1904, obra de Eugène Joannon. Mas, após o Terremoto de Chillán, ocorrido em 1939, a igreja teve que ser demolida em razão dos graves danos sofridos.

Antiga Catedral de Concepción, por volta de 1925-1930, bastante danificada pelo terremoto de 1939, demolida no mesmo ano para construção da nova. Plaza de la Independencia, Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.
Com a demolição do antigo templo, a nova Catedral de Concepción começou a ser construída em 1940 e concluída em 1950, em estilo neorromânico com elementos góticos. Foi consagrada em 1964.

Catedral de la Santísima Concepción, estilo neorromânico com elementos góticos. Plaza de la Independencia, Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.
A Plaza de la Independencia é a Plaza de Armas de Concepción, o verdadeiro núcleo da cidade, por sua importância histórica-social; tem esse nome por que foi aqui que o grande herói nacional Bernardo O'Higgins fez a declaração solene de independência do Chile, em 1º de janeiro de 1818, da Coroa Espanhola.
A praça foi instalada em 1752, quando o assentamento urbano foi deslocado do litoral para o Valle de la Mocha, após o terremoto e o maremoto de 1751.
A praça foi remodelada em meados do século XIX; no projeto do engenheiro Pascual Binimelis foi planejado um grande monumento no centro do logradouro, fundido em Liverpool, Inglaterra, sob o encargo de Augusto Bleuze, tendo no alto da coluna a estátua da deusa Ceres, representando a fertilidade agrícola, tudo isso rodeado de jardins. Quatro imponentes lanternas de ferro saem da coluna, enquanto na base têm-se quatro sereias soprando suas conchas que vertem água na fonte. A nova praça e o monumento foram inaugurados em 1856.
Entre 2004 e 2005, fizeram nova remodelação, inclusive com a instalação de estacionamentos subterrâneos.

Monumento a Ceres, Plaza de la Independencia, Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.
Já caindo a noite, nós resolvemos jantar em um restaurante de comida chilena, o Chela's Restaurant, calle Barros Arana com Lincoyán; Eunice, como é de seu costume, perguntou qual era o prato típico da região. Ao saber que era cazuela de pollo chilena, foi o seu pedido.
Os ingredientes da cazuela de pollo são pedaços de frango, cebolas picadas, cenouras raladas ou picadas, milho com espiga, batatas descascadas, aipo, salsa, orégano, alho e cominho.

Cazuela de pollo chilena, Chela's Restaurant, calle Barros Arana com calle Lincoyán. Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.
O nosso planejamento era, no dia seguinte, visitar Talcahuano, na Bahía de Concepción, local onde, até hoje, está em exposição o monitor encouraçado peruano Huáscar, capturado, em 1879, pela esquadra chilena, no combate naval de Angamos, durante a Guerra do Pacífico (ver post Valparaíso e Viña del Mar - Chile - 2010).
Alimentados, fomos dormir no hotel Uno, mas, na madrugada de 27 de fevereiro de 2010, por volta das 03:30h, a viagem acabou: um terremoto, que alcançou a magnitude 8,8 na chamada escala Richter, ou seja, o segundo maior registrado no Chile e o oitavo, no mundo, ocorreu no fundo do oceano Pacífico, a cerca de 150 km de Concepción, abalando fortemente, por cerca de 3 minutos, o hotel em que nós estávamos dormindo.
Durante o primeiro tremor, a cama se deslocou por algumas vezes de uma parede a outra do quarto, chocando-se, e o teto de gesso caiu sobre nós; logo que cessou o abalo, imediatamente nos vestimos com alguma roupa que conseguimos alcançar, no escuro, e descemos descalços, com risco de ser lesionados pelos cacos de vidro espalhados na escada, resultado do estilhaçamento das janelas.
Logo fomos para o centro da Plaza de la Independencia, local mais seguro, haja vista que os prédios do seu entorno ficam a uma certa distância da calçada da praça.
Ali, aguardamos o amanhecer para, se possível, voltarmos ao hotel para retirar o resto de nosso material. Enquanto esperávamos, sentimos várias réplicas, que são novos abalos, acomodações após o grande deslocamento das placas tectônicas, chegando a alcançar a magnitude 6,9 na escala Richter.
Nos primeiros raios do sol, fomos ao hotel Uno e, após recebermos autorização apenas para entrar e retirar imediatamente os pertences, assim o fizemos, e retornamos à praça, deixando as bagagens nas proximidades do banco em que estávamos acampados.

Nosso hotel Uno, avariado após o terremoto de 27.02.2010, calle Barros Arana, 741, Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.

Preparando a fogueira na Plaza de la Independencia, nossa base de apoio e onde passávamos a noite; Eunice na companhia da francesa Eva Sarramagnan, terremoto de 2010. Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.
Em seguida, fomos ao hotel Germania, da mesma rede, e conseguimos um apartamento para nos alojarmos; guardamos nossas bagagens no quarto, mas, temerosos com as réplicas, não quisemos dormir sob uma edificação, preferindo pousar na praça, acreditando ser mais seguro, no caso de novo abalo.
Na oportunidade, conhecemos os franceses René e Eva Sarramagnan, que, apesar de contarem com mais de sessenta anos, eram aventureiros, navegantes de longa distância. Residiam na França continental, na cidade Rochefort-sur-Mer, mas passavam uma parte de ano nas Polinésias Francesas, para qual iam no seu barco. Com eles, que falavam razoavelmente espanhol. dividimos nossas angústias e apreensões, por não conseguirmos contato com nossos familiares no Brasil.

Restaurante do Hotel Germania após o abalo sísmico de 2010; calle Anibal Pinto, 295, Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.

Literalmente dormindo na praça, nós e René Sarramagnan, Plaza de la Independencia, terremoto 2010, Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.
Não foram dias fáceis: a Defesa Civil não foi muito eficiente: não havia comida suficiente para os desabrigados, os supermercados foram fechados, em razão dos saques, e, portanto, não havia lugar para adquirir mantimentos; os restaurantes também estavam de portas cerradas; o hotel liberou o consumo dos alimentos que estavam estocados, mas não se responsabilizava pela condições de consumo deles, posto que não havia mais refrigeração.
Por conta dos diversos danos causados nas instalações elétricas e hidráulicas dos logradouros públicos e das edificações, os fornecimentos de energia elétrica e de água foram interrompidos, para que não houvesse incêndios e desperdício de água potável. Assim, não havia água corrente e luz; sem poder fazer a higiene pessoal e escuridão à noite.
Havia filas enormes para conseguir comida e água, distribuídos pela Defesa Civil.
Dependendo das condições do solo e da solidez da construção, muitos edifícios sofreram poucos danos, enquanto outros literalmente desabaram; também houve estragos em algumas vias públicas.
Muitas pessoas que não puderam retornar a suas habitações tiveram que dormir nas ruas ou dentro de seus veículos. Algumas foram impedidas de entrar em suas residências e não tinham como trocar suas roupas.
As estradas também sofreram danos, sendo que alguns trechos não permitiam a passagem dos veículos, o que nos impedia de partir de Concepción, além da impossibilidade de abastecer o carro, tendo em vista que os postos de combustíveis estavam fechados, tudo leva a crer, em razão da falta de energia e risco de incêndio.
Assim, ficamos por cerca de três dias, com comida e água restritas e dormindo literalmente na praça.

Monumento à deusa Ceres danificado após o terremoto de 2010, Plaza de la Independencia, Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.

Danos no monumento a Ceres, Plaza de la Independencia, terremoto de 2010, Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.

Luminária danificada na Plaza de la Independencia, terremoto 2010; ao fundo, Teatro Universidad de Concepción, Calle O'Higgins, 660, Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.

Lojas danificadas na Calle Maipú, 737, ao lado da antiga Muebles Muñoz, terremoto de 2010. Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.

Loja bastante danificada, Calle Colo Colo, 707, ao lado da Ferretería Pandora, terremoto de 2010, Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.

Edifício desabado próximo a Colo Colo, 534, ao lado da Loja de Departamentos Johnson, terremoto de 2010. Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.

Vidraças quebradas e canos danificados no Banco Edwards-Citi, Calle Anibal Pinto, 372, terremoto de 2010. Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.

Lateral danificada da Iglesia de Santo Domingo, La Pompeya, Calle San Martín, 327, terremoto de 2010. Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.

Bueiro e pista danificados, cruzamento das Calles San Martín com Lincoyán, próximo Consorcio Concepción, terremoto de 2010. Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.

Supermercado Versluys danificado, Calle San Martín, 654; ao fundo, Hotel Germania, terremoto de 2010. Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.

Sobrado bastante danificado (Dominga), Calle San Martín, 758, terremoto de 2010. Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.

Torre O'Higgins (edifício de escritórios) danificada no terremoto de 2010, Av. Libertador O'Higgins, próximo 240, Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.
Lamentáveis foram os saques às lojas; nós testemunhamos alguns. Seria até compreensível se as pessoas estivessem pegando gêneros de subsistência, em razão de sua escassez, o conhecido furto famélico, cuja natureza criminal é excluída em razão do estado de necessidade. Ocorre que os estabelecimentos que eram alvos dos saques, na maioria das vezes, não tinham itens essenciais à sobrevivência. Nós vimos saques em lojas de eletrodomésticos, com os ladrões visando particularmente os eletrônicos, como televisões, aparelhagens de som, computadores, etc.
Outros alvos preferenciais eram as farmácias. Esses estabelecimentos, no Chile, são autorizados a comercializar produtos caros, como perfumes e cosméticos importados, exatamente o que os saqueadores furtavam.
Também vimos furtos de combustíveis nos postos; por meio de mangueiras introduzidas nos tanques subterrâneos, os saqueadores sugavam os líquidos e os colocavam em tonéis.
No início, os ladrões agiram com certa liberdade, haja vista o número pequeno de policiais na guarnição local para tantos saques.
Somente após a chegada de reforços, é que a repressão aumentou, e nós tivemos a oportunidade de assistir a detenção de alguns saqueadores.
Nesta hora é que a gente sente falta da polícia.

Suspeitos de saques detidos pela Força de Segurança, após o terremoto de 2010, em frente ao prédio da Gobernación Provincial de Concepción, Plaza de la Independencia, Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.

Bispo e padres oficiando missa em frente a Catedral de Concepción, Plaza de la Independencia, pedindo a proteção divida depois do terremoto de 2010. Concepción, capital da província de mesmo nome, Región del Biobío, Chile.

Eva Sarramagnan partindo no avião da Fuerza Aerea de Chile, possivelmente para sua Rochefort-sur-Mer, na França. Chile.
7 - Volta a Santiago
No hotel em que guardávamos nossa bagagem, o Germania, havia um casal de chilenos com um filho; quando chegou a notícia de que as forças de segurança haviam construído acessos precários nas laterais das rodovias, restabelecendo o tráfego, os chilenos, tendo conhecimento que estávamos com um carro, mas com meio tanque, fizeram uma proposta: nós os levaríamos no carro até a metade do percurso em direção a Santiago; em contrapartida, de Santiago sairiam parentes deles em um veículo, transportando combustível suficiente para, abastecendo nosso carro, pudéssemos alcançar Santiago com folga.
Assim fizemos e levamos também um executivo chileno, que estava alojado no mesmo hotel. Foi uma viagem penosa, pois, além da preocupação com o consumo do combustível, rezando para que ele nos levasse até a metade do percurso, havia muitas interrupções no fluxo, em razão dos desvios nos locais em que a rodovia estava danificada. Em alguns trechos, por causa do abalo, havia um desnível na pista de cerca de um metro. Como nos desvios de piso de terra a velocidade do carro diminuía muito e, muitas vezes, tinha que parar, para que o consumo não aumentasse, Eunice, que estava na condução, desligava o veículo, e eu, o casal e o executivo empurrávamos o carro. E foi assim até encontrarmos os parentes do casal. Nesse momento, eles abasteceram nosso carro, nos despedimos e o casal seguiu com seus familiares. Nós continuamos até Santiago, deixamos o executivo em seu prédio, no bairro Providencia, e fomos para o hotel. Lá, tomamos um banho, lanchamos e dormimos, mas não muito relaxados, por causa das réplicas, que, de vez em quando, faziam a estrutura do prédio tremer.
Nos dias posteriores, aproveitamos para nos deliciar com a cozinha chilena, enquanto aguardávamos o voo de retorno ao Brasil.

Jantando no bairro Providencia, após retorno de Concepción. Santiago, Región Metropolitana de Santiago, Chile.

Restaurante La Bota de Donata, italiano, calle Constitucion, 30, Loc. 100, 101, Patio Bellavista, Santiago, Región Metropolitana de Santiago, Chile.

Restaurante La Bota de Donata, na companhia de brasileiros, calle Constitucion, 30, Loc. 100, 101, Patio Bellavista, Santiago, Región Metropolitana de Santiago, Chile.
E o nosso sanduíche preferido: o completo do Dominó, lanchonete cujo carro-chefe é o cachorro-quente com os molhos com as cores da bandeira da Itália: tomate, maionese e abacate.

Dominó (hot dog) Fuente de Soda, Paseo Ahumada 146, ao lado do Café Haiti, Santiago, Región Metropolitana de Santiago, Chile.
Por fim, embarcamos no Aeropuerto Arturo Merino Benítez; por causa dos danos sofridos, o embarque foi realizado em salas improvisadas, montadas para isso.

E assim, depois dessa grande aventura, voltamos ao nosso país, para, em junho do mesmo ano, partirmos para a Alemanha, mas isso é estória para outros posts.
Fontes:
Wikipédia;
https://www.facebook.com/arqconce/photos/catedral-de-concepci%C3%B3n-ca-1925-1930arquitectos-jean-herbage-1867-y-eug%C3%A8ne-joanno/678414032243293/
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